6 de janeiro de 2011

8.2.1 Imobilismo político e crescimento económico do pós-guerra a 1974

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A estagnação do mundo rural


A neutralidade de Portugal durante a guerra permitiu a permanência do regime salazarista que soube habilmente conduzir a diplomacia e evitar alianças incómodas. Nos anos 70 em vésperas da Revolução dos Cravos o país continuava atrasado e desfasado da evolução das economias europeias. 

No aspecto agrícola, sector protegido pela retórica tradicionalista do poder o país estava mergulhado no atraso com velhas técnicas e uma exploração agrícola antiquada e poucoo produtiva. Apesar do grande número de pessoas que dependiam da terra a produtividade era baixíssima e não atingia metade da média europeia. 
No II Plano de Fomento de 1959, procurou-se modernizar a agricultura e promover a exploração agrícola mecanizada e de média dimensão como base para um bom rendimento dos proprietários e um nível de consumo que sustentasse a indústria. No entanto contra essas medidas se terão erguido as vozes dos grandes proprietários do sul que procuraram inviabilizar tais esforços. 
Incentivos e subsídios acabaram nas mãos de vinhateiros e latifundiários desta forma desviando-se dos objectivos que tinham estado na sua base. Também os preços agrícolas e os salários se mantiveram muito baixos com isso se prejudicando a rentabilidade das explorações e de toda a economia. 


A emigração

A emigração foi a solução para muita da gente do interior mas também das cidades. Eternizando a pobreza o país perdeu dinamismo com a emigração. Esta, tornou-se mais intensa à medida que o atraso dos campos se acentuava face a uma Europa onde as condições de vida melhoravam a todo o momento. O défice agrícola cresceu para 25% do défice global do país. 
A emigração teve razões políticas também com a fuga de muitos jovens à guerra colonial ao longo dos anos 60. Clandestina na maior parte das situações a emigração forneceu muito capital à nossa economia por via das remessas que eram permitidas pelos acordos de transferência de capitais. 
A emigração se teve algumas vantagens nomeadamente económicas teve inconvenientes no envelhecimento da população e reduziu a população activa. 




O desenvolvimento industrial 


Apesar da política de autarcia desenvolvida por Salazar o país continuou dependente do fornecimentos de matérias primas, bens e equipamentos importados. A guerra acentuou a escassez e chamou a atenção para a necessidade de industrializar o país. 
Em 1945 a Lei de Fomento e Reorganização Industrial estabeleceu as bases da política de industrialização das décadas seguintes que no entanto acentuava a vertente de isolacionismo económico que vinha sendo desenvolvida. O I Plano de Fomento (1953 a 1958) acentuou o investimento público na modernização de infraestruturas de comunicação, electricidade e transportes. 
O II Plano de Fomento desenvolvido entre 1959 e 1964 incidiu privilegiadamente nas indústrias transformadoras de base como as alimentares químicos, petróleos, siderurgia etc. Esta fase assistiu à entrada de Portugal na EFTA, a assinatura dos acordos de comércio livre e acordos com o Banco Mundial e o FMI. Entre 1965 e 1967 desenvolveu-se um Plano Intercalar de Fomento que prenunciou novas orientações do comércio e do investimento viradas para o comércio externo. O conjunto destas medidas representou o abandono das políticas de autarcia e de isolamento e a entrada de investimento estrangeiro no país através da instalação de várias linhas de montagem de bens de consumo como automóveis e electrodomésticos. 
O 3º Plano de Fomento desenvolvido a partir de 1968 por Marcelo Caetano aceitava claramente as regras do comércio internacional e apoiava a lógica de concorrência e de concentração empresarial além de incentivar a exportação nomeadamente de têxteis, lanifícios e calçado e o investimento estrangeiro no país. 




Urbanismo 


A par das transformações económicas processou-se uma transformação urbana assinalável. As migrações de populações rurais para os grandes centros urbanos acentuou-se atraídas pelo emprego na indústria e comunicações então em grande desenvolvimento. Cidades desde Braga a Setúbal conheceram grande expansão. No entanto, a par desta migração não houve a correspondente construção de infraestruturas que continuaram obsoletas. Os ordenados mantiveram-se também a níveis muito baixos e o modelo de desenvolvimento não permitia um crescimento assinalável do PIB motivo pelo qual continuavam a existir muitos bairros de lata, construções clandestinas e falta de saneamento básico e de transportes públicos eficientes. 




O fomento económico das colónias 


O modelo de desenvolvimento das colónias foi até aos anos 40 o tradicional sem grandes investimentos industriais remetendo as colónias para o papel de fornecedoras de matérias primas aliás conforme o estipulado no Acto Colonial de 1930. A partir de 1953 o desenvolvimento das colónias seguiu a par com o estipulado nos planos de fomento estimulando-se o investimento público e privado e abrindo-se as portas ao investimento estrangeiro. Desenvolveram-se infraestruturas de transportes e os sectores agrícolas e extractivo. Também a industrialização se desenvolveu com capitais privados e estrangeiros atraídos pelas riquezas imensas dos territórios mesmo após o início da guerra colonial período durante o qual o investimento ainda aumentou mais. 




Radicalização de posições e o sobressalto político de 1958


Com o final da guerra e o fim das ditaduras do eixo também em Portugal se anunciavam mudanças que se acreditava poderem mudar a face do país. Convocaram-se eleições livres antecipadas e anunciaram-se medidas de revisão constitucional. Ainda no ano de 1945 fundou-se o MUD - Movimento de Unidade Democrática, fizeram-se propostas de alteração do calendário eleitoral e sugeriram-se mudanças: 

  • liberdades de reunião, expressão e de opinião, 
  • reformulação de cadernos eleitorais 
  • adiamento das eleições para permitir a formação de partidos. 

As reivindicações não foram satisfeitas. As listas de adesão ao MUD foram analisadas pela política política que exerceu repressão sobre todos aqueles que ao movimento tinham aderido. 


A evolução das tensões da Guerra Fria e o alastramento do comunismo na Europa sobressaltaram o regime, travaram as reformas e Portugal aderiu à NATO. 
Em 1949 novo acto eleitoral para eleição de Presidente da República viu a candidatura de Norton de Matos surgir no quadrante democrático mas o clima de repressão obrigou-o a desistir. 
O acontecimento seguinte que concentrou os esforços da oposição foram as eleições de 1958  também para a Presidência da República. O candidato do regime era Américo Tomás enquanto o da oposição era o general Humberto Delgado. A candidatura do "General sem Medo" provocou grande entusiasmo e mobilização popular mas Américo Tomás foi eleito com 75% dos votos deixando no ar a suspeita de manipulação de resultados. Salazar, procurando evitar a repetição de situações semelhantes alterou a constituição substituindo o sufrágio directo pela eleição por um colégio eleitoral. 




Os anos seguintes foram de contestação vinda de todos os quadrantes. Católicos e opositores dos mais diversos fizeram aumentar a repressão do regime. O bispo do Porto D. António Ferreira Gomes, foi exilado por discordar das posições de Salazar e os acontecimentos precipitaram-se. A guerra colonial começara e a contestação aumentava. O exílio e a morte de Humberto Delgado, o apresamento do navio de cruzeiro Santa Maria por Henrique Galvão em 1961, foram episódios que Salazar não conseguiu resolver de forma satisfatória. Galvão e os restantes assaltantes foram entregues pelas autoridades americanas ao Brasil, que lhes ofereceu asilo.  

A questão colonial

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Num contexto internacional de descolonização em andamento e a aceitação internacional da legitimidade de autonomia dos territórios coloniais Portugal assumiu uma posição desfasada e em contracorrente das posições internacionais. Baseando-se no lusotropicalismo difundido por Gilberto Freire nos anos 50 e a mística expansionista e nacionalista que fundamentava o Estado Novo Portugal assumiu uma posição de resistência aos movimentos de descolonização que a partir de 1961 afectaram todas as colónias portuguesas. Entretanto na sequência de algumas pressões internacionais que se vinham exercendo no quadro das Nações Unidas e da evolução política internacional no contexto da bipolarização, algumas medidas tinham sido tomadas por Salazar: 

  • 1949 Portugal faz parte da Nato.
  • 1951 revogação do Acto Colonial. Mudança do léxico colonialista. Províncias Ultramarinas em vez de colónias e integração do seu estatuto na Constituição através da reforma constitucional de 1951. 
  • 1955 Portugal subscreve a Carta das Nações Unidas.
  • 1959 Portugal na OCDE. 
  • 1960 Portugal integrado na EFTA.
  • A política económica das províncias ultramarinas foi reformulada e actualizada e o investimento em infraestruturas e na educação pretendia legitimar a ocupação, no quadro do 1º Plano de Fomento de 1953 a 1957: infraestruturas, transportes e sectores extractivos. 
  • O papel evangelizador das Missões Católicas era reforçado com o Acordo Missionário de 1940 e posteriores reorganizações das dioceses e missões apoiadas pelo Estado e governos provinciais. 
  • Com o início das lutas pela libertação opõem-se duas teses: integracionista e federalista. A tese federalista defendia a progressiva autonomia das colónias e a constituição de uma federação de estados que salvaguardasse os interesses portugueses; a tese integracionista simplesmente advogava a continuação do colonialismo. Apesar da contestação de vários sectores da sociedade e do exército, que propunham o caminho da autodeterminação, os primeiros acontecimentos, ocorridos em Angola levaram ao envio de tropas e ao início de uma longa guerra. 




A luta armada


Os confrontos iniciaram-se no norte de Angola em 1961 mas os movimentos de libertação já existiam antes: Angola surgiu a UPA-FNLA em 1955; o MPLA em 1956; a UNITA em 1966. A guerra iniciou-se em 1961.
  • Guiné, surgiu o PAIGC em 1956. A guerra iniciou-se em 1963.
  • Moçambique, surgiu a Frelimo em 1962. A guerra iniciou-se em 1964.
A guerra exigiu um enorme esforço ao Estado português que desviou imensos recursos financeiros para enfrentar uma guerra e desenvolver territórios que estavam condenados a ser perdidos. 


Isolamento Internacional


Diversos acontecimentos e debates na ONU marcaram a contestação internacional à ocupação colonial que nem a retórica nem a semântica institucional e governamental conseguiram mudar. Desde 1955 que Portugal teimava em considerar de forma mal fundamentada que os territórios africanos eram parte integrante da nação e não colónias como eram designadas pelos opositores nomeadamente os países do Terceiro Mundo que contra argumentavam apresentando factos e denunciando situações. A partir de 1961 a posição de Portugal foi condenada nas Nações Unidas tendo a resistência do governo levado ao isolamento progressivo face ao desrespeito pela Resolução 1514


Também a administração americana durante a presidência de Kennedy censurou severamente a posição portuguesa que provocava o extremar de posições dos movimentos armados,  levando estes  a uma aproximação progressiva da União Soviética e de Cuba. Por isso os E.U.A. financiaram grupos armados como a FNLA e a UNITA mas também sugeriram soluções de compromisso com promessas de auxílio económico a Portugal caso recorresse a uma solução pacífica e negociada. 
No entanto a resistência de Salazar foi trágica sabendo usar habilmente o trunfo da base das Lages de que os americanos necessitavam para o seu esforço de guerra no Vietname nomeadamente a partir da presidência de Johnson e Nixon. 




A Primavera Marcelista


Subindo ao poder em substituição de Salazar doente, acreditava-se que Marcelo Caetano conseguiria reformar o regime encontrando uma via para a resolução dos maiores problemas do país: a guerra colonial e a falta de democraticidade do regime. 
Algumas medidas foram feitas: 

  • Abrandamento da repressão pela polícia política
  • Mudança da designação da PIDE para DGS
  • Abrandamento da censura sobre a informação e a criação artística e literária
Outras reformas políticas foram realizadas na preparação para o sufrágio de 1969
  • institucionalização do voto feminino
  • autorização de fiscalização dos cadernos eleitorais pela oposição
  • fiscalização das mesas de voto
  • legalização de agrupamentos políticos da oposição
Os resultados das eleições para a Assembleia Nacional contrariaram as melhores previsões. Os lugares do Parlamento foram todos ocupados por deputados do regime e uma onda de protestos sobreveio nomeadamente nas zonas urbanas mais importantes: protestos de estudantes, operários e gente da cultura fizeram aumentar a repressão e afastar as perspectivas mais optimistas. 



O impacto da guerra colonial


O desejo de resolução da guerra colonial de forma pacífica foi contrariado com a rejeição dessa hipótese pelos principais chefes militares que desejavam a continuação do conflito. Marcelo Caetano embora redigindo um projecto de revisão do estatuto das colónias que levaria a uma autonomia progressiva não teve também o apoio desejado da maioria conservadora da Assembleia Nacional. A política continuou sendo a mesma e a luta armada reforçou-se por parte dos movimentos de libertação principalmente na Guiné. 
Ao mesmo tempo o isolamento internacional acentuou-se e Portugal perdeu gradualmente os aliados, tendo mesmo o Vaticano recebido representantes dos principais movimentos. A O.N.U. reconheceu a independência da Guiné em 1973 e a imagem internacional do governo tornou-se insustentável. 
Na Assembleia Nacional surgiu uma ala liberal corporizada por Pinto Balsemão e Sá Carneiro.  A contestação dos católicos progressistas aumentou bem como a formação de grupos oposicionistas  de extrema esquerda como a LUAR de Palma Inácio. Alguns sectores do próprio exército reconheciam a necessidade de uma solução negociada e o fim da guerra colonial e gradualmente Marcelo Caetano apercebeu-se de que o regime estava sem saídas em vésperas de 25 de Abril de 1974. 

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